Tudo que você precisa saber sobre Vitamina B12

Tudo que você precisa saber sobre Vitamina B12

  • Lucas Alvarenga
  • Lucas Alvarenga

Temos recebido inúmeras perguntas relacionadas à vitamina B12. Pedimos autorização ao Dr. Eric Slywitch, Diretor do Departamento de Medicina e Nutrição da Sociedade Vegetariana Brasileira, para partilhar algumas informações bastante esclarecedoras. Por exemplo, você sabia que cerca de 50% dos vegetarianos têm carência de vitamina B12 e cerca de 40% dos não vegetarianos também?

Por que antes as pessoas não falavam da deficiência de vitamina B12? Essa descoberta é recente?

Os maiores estudos científicos com populações vegetarianas começaram a ser publicados na década de 70. Esses estudos começaram a demonstrar que os vegetarianos tinham baixa ingestão de B12 (no caso dos ovolactovegetarianos) ou nula (no caso dos veganos). Em novembro de 1993, o parecer oficial da Associação Dietética Americana já recomendava, explicitamente, que os vegetarianos fizessem a suplementação dessa vitamina. Portanto, essa recomendação é antiga e já adotada pelo menos desde 1993.

Conseguíamos B12 do solo e da pouca higiene dos alimentos na antiguidade?

Provavelmente e historicamente não. Há mais de 3 milhões de anos, existiu um hominídeo que chamamos Paranthropus bosei. Segundo suas características fósseis, esses hominídeos eram vegetarianos. Não eram exatamente como nós, e se alimentavam de partes dos vegetais que nossa fisiologia não permite. Eles foram dizimados na era das glaciações, pois houve escassez de alimentos vegetais.

A ideia do ser humano antigo numa vida completamente harmônica com a natureza não encontra respaldo em inúmeras pesquisas. A vida era bem selvagem (talvez não menos, mas de uma forma diferente da de hoje). A história da medicina e nutrição mostra claramente as inúmeras carências nutricionais que sempre existiram, mas que não eram diagnosticadas por falta de conhecimento na época. As descobertas vieram aos poucos, como é de se esperar. Os nossos ancestrais remotos conseguiam a B12 provavelmente porque comiam carne.

Se precisamos suplementar a vitamina B12, quer dizer que a dieta vegetariana não é adequada ao ser humano?

Não, não quer dizer isso. Em diversos ciclos da vida e condições orgânicas, pode ser necessário o uso de suplementos. Isso pode ocorrer por baixa ingestão dos alimentos ou nutrientes, por dificuldade de retirarmos o nutriente do alimento ou por problemas no organismo que fazem com que a sua absorção e utilização (ou perda) sejam comprometidas.

Como exemplo, a Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda que as crianças recebam suplementação de ferro dos 6 meses aos 2 anos de idade, frente ao elevado índice de anemia nesse período. É estimado que metade das crianças com menos de 5 anos e 1/3 das gestantes no Brasil tenham carência de ferro.

A suplementação com ácido fólico é feita para mulheres que querem engravidar. Diversos obstetras prescrevem rotineiramente suplementações vitamínicas e minerais para gestantes. A gestação exige aporte de ferro extra, com suplementação.

O Instituto de Medicina dos Estados Unidos recomenda que as pessoas com mais de 50 anos de idade utilizem suplementos de B12, pois pelo menos 30% dessa população mostra deficiência dessa vitamina.

O iodo é adicionado ao sal que consumimos, para que esse mineral chegue a pessoas que moram em regiões distantes do mar. A sua falta causa sérios problemas mentais em crianças (cretinismo), além de dificuldade na produção de hormônio da glândula tireóide.

A fortificação das farinhas com ferro e ácido fólico não visa a atingir os vegetarianos, mas sim a população onívora.
Como você pode notar, mesmo os onívoros estão sujeitos a diversas deficiências nutricionais.

O fato que incomoda alguns profissionais de saúde é o fato de que mesmo com uma dieta bem balanceada, uma dieta vegetariana estrita não supre todos os nutrientes (por causa da B12).

No entanto, assim como o ferro, a B12 depende muito mais do nosso metabolismo do que da quantidade que ingerimos. Enquanto 50% dos vegetarianos apresentam deficiência de B12, isso ocorre com 40% das pessoas que consomem carnes e derivados da América Latina. Veja que a diferença é pequena!

Há pessoas que são vegetarianas há anos e não têm sintomas de deficiência de vitamina B12. Como explicar isso?

O nosso organismo pode estocar a B12 por muitos anos. Uma pessoa com bom estoque de B12 precisa absorver, diariamente, 1 mcg de vitamina B12 proveniente da dieta para manter os bons níveis. Por meio da secreção biliar, 1 a 10 mcg de vitamina B12 são lançados diariamente no intestino e ela pode retornar para o sangue após ser absorvida.

Assim, conseguimos “reciclá-la” evitando sua perda intestinal nesse ciclo que chamamos êntero-hepático (do intestino para o fígado). No entanto, mesmo com esse ciclo preservado, ocorrem pequenas perdas de B12 para as fezes, e os seus níveis sanguíneos são reduzidos. Assim, quem não ingere B12, vai perdendo gradativamente a que tem no organismo.

Existe a possibilidade de o indivíduo excretar muito pouca B12 pelas vias biliares ao intestino e reabsorvê-la com muita eficiência, fazendo com que mantenha a B12 no organismo facilmente. São poucos os indivíduos com essa habilidade.

Pessoas que são vegetarianas há muito tempo podem não ter sintomas de deficiência, mas costumam apresentar níveis baixos de B12. Com isso, compostos que dependem da B12 para serem metabolizados ficam alterados e isso é nocivo para a saúde.

Lembre-se que diversas alterações orgânicas são assintomáticas, mesmo sendo nocivas. Para ilustrar, o colesterol elevado não traz sintomas, assim como o início de problemas renais e hepáticos também não. Muitos órgãos no nosso corpo “avisam” que estão com problemas apenas quando o seu comprometimento limita de 70 a 80% das suas funções. A sua artéria carótida (que fica no pescoço e leva sangue ao cérebro) pode ter uma obstrução (entupimento) de mais de 50% e não trazer sintoma algum.

Não é prudente aguardar os sintomas aparecerem para verificar o que ocorre. Um bom profissional de saúde está apto a fazer uma avaliação para verificar como está a sua saúde.

Na minha experiência profissional, vejo que praticamente todos os indivíduos com níveis baixos de B12 têm sintomas, mas esses sintomas não são atribuídos à falta de B12 até que seja mostrado à pessoa que não é normal sentir o que ela sente. Esses sintomas desaparecem ao utilizar a B12.

Só após 5 anos de dieta vegetariana devo começar a me preocupar com a B12?

De forma alguma. Essa ideia surge pelo fato de podermos estocar a B12 e o estoque ser passível de uso por 3 a 5 anos. Preste bem atenção: a matemática nem sempre serve para as ciências biológicas. E nesse caso, definitivamente, não serve!

O cálculo do estoque que dura 5 anos é teórico. Além disso, ele parte do princípio de que o estoque está cheio no momento em que a pessoa se torna vegetariana. Ledo engano! Tenho pacientes, vegetarianos há 1 mês, com deficiência de B12. Claramente o problema não é devido à dieta vegetariana, pois esse tempo não seria suficiente para isso. Há fatores orgânicos e dietéticos que influenciam o estoque de B12.

Portanto, vegetariano ou não, você deve avaliar a B12 desde já. Todo profissional que recebe no consultório alguém que tem a intenção de se tornar, ou que já é, vegetariano, deve medir os níveis de B12 dessa pessoa imediatamente, não importando o tempo e o tipo de dieta seguida anteriormente.

Todo profissional que acompanha vegetarianos deve solicitar a medição de B12 na primeira consulta, independente de a pessoa ter sintomas ou de há quanto tempo é vegetariana. Não falo isso apenas baseado em estudos publicados, mas sim pela experiência em consultório. Tem muito vegetariano com baixos níveis de B12! Da mesma forma como há muitos onívoros com carência de B12!

De onde vem a B12 utilizada nos suplementos?

B12 nos suplementos é proveniente de cultura de bactérias em laboratório.

Só preste atenção se você for utilizar produtos comprados em farmácias, pois alguns deles podem conter alguns derivados animais. O fato é que a B12 provém de bactérias.

Algas, alimentos fermentados e levedo de cerveja contêm B12?

Nenhum desses alimentos pode ser considerado uma fonte segura de B12. Apesar de algas e alimentos fermentados, como o missô, poderem apresentar pequenas quantidades de vitamina B12, ela é considerada uma forma inativa da vitamina, não sendo adequada aos seres humanos.

Muitas algas necessitam de B12 para o seu desenvolvimento e metabolismo e, por um processo simbiótico com bactérias (que são as produtoras de B12), incorporam essa vitamina. As algas Nori e Chorella são as que apresentam teor mais elevado. No entanto, até o momento nenhuma delas se mostrou adequada para corrigir os baixos níveis de B12 apresentados em humanos que se submeteram a testes de correção ingerindo essas algas.

Portanto, nenhuma alga deve ser consumida com o intuito de obtenção de vitamina B12. Não se arrisque!

Consumo ovos, derivados de leite e alimentos fortificados. Devo me preocupar com a B12?

Sim, deve! Apesar de esses produtos conterem B12, a quantidade necessária para a manutenção do organismo, via de regra, não é mantida a longo prazo. São inúmeros os pacientes ovolactovegetarianos que atendo com baixos níveis de B12. Apesar de esses indivíduos ingerirem B12 e de apresentarem decaimento teórico da B12 no sangue mais lento do que os veganos, a longo prazo costuma haver redução nos níveis sanguíneos.

Posso utilizar a B12 sem saber como está o nível no meu organismo?

Como não há relato de efeitos tóxicos por excesso de B12 na literatura científica, podemos considerar que ela é uma vitamina bastante segura (quanto à toxicidade) para uso, mesmo se você estiver com bons níveis no sangue. No entanto, seu uso sem correta avaliação pode causar consumo metabólico de outros elementos no organismo.

A importância de saber como estão os seus níveis sanguíneos se faz para a definição da conduta terapêutica (tratar a deficiência ou fazer apenas a manutenção), assim como para saber se outros cuidados devem ser tomados em conjunto.

Devo utilizar a B12 proveniente de farmácia de manipulação ou das indústrias farmacêuticas?

Para se utilizar qualquer produto proveniente de farmácias de manipulação deve-se ter o cuidado de conhecer bem a farmácia e a qualidade dos insumos com que trabalha. Os produtos provenientes de grandes marcas da indústria farmacêutica costumam ser confiáveis.

Quais os cuidados que devemos ter na gestação e infância com relação à B12?

Nesses ciclos da vida sempre é recomendada a suplementação de B12, independente de o indivíduo consumir ovos ou laticínios. Para bebês e crianças, costumo prescrevê-la na forma de xarope. É importante realizar a dosagem de B12 para todas as gestantes e bebês. Mulheres, vegetarianas ou não, que pretendem engravidar devem obrigatoriamente avaliar a B12. A vitamina B12 tem a mesma importância que o Ácido Fólico para a formação do bebê. Para gestantes e crianças, toda a atenção deve ser tomada com relação à B12.

O consumo de carne garante um bom estado nutricional de vitamina B12?

Não, não garante! Tanto é que 40% das pessoas que comem carne têm carência dessa vitamina, enquanto que isso ocorre com 50% dos vegetarianos. Veja que a diferença é pequena.

Por que podemos ingerir boa quantidade de B12 e mesmo assim ter deficiência?

Porque ela depende mais do seu metabolismo do que da sua dieta. Há 2 formas principais para perdermos a B12 que está no nosso organismo. Uma delas é pelo processo de reciclagem intestinal que todos nós temos (tecnicamente chamamos isso de ciclo êntero-hepático). Nossa vesícula biliar pode lançar até 10 mcg de vitamina B12 por dia no intestino. O intestino procura colocá-la de volta no sangue. Essa quantidade lançada ao intestino e a habilidade de ele reabsorver a vitamina é variável de pessoa para pessoa. Uma dieta rica em carnes, queijo e ovos (fontes de B12) dificilmente conseguirá atingir 7 mcg. Isso significa que pode haver mais perda pelas fezes do que a pessoa consegue ingerir.

Minha recomendação:

Meça sempre o nível de B12 no sangue. Esse exame deve fazer parte de qualquer avaliação nutrológica. As doses para correção ou manutenção são variáveis e não é possível estabelecer uma dose padrão para todas as pessoas.